“Maior tolerância ao esforço, menos queixas respiratórias, melhorias do humor” e até menos recurso a “consultas desnecessárias”, como atesta em entrevista ao JZ a médica Madalena Rapazote, impulsionadora da equipa de saúde (medicina, enfermagem, secretaria clínica) que desde há oito meses mobiliza os utentes para caminhadas semanais, em percursos tranquilos com a paisagem verde de Sintra como cenário.
Vale acompanhar esta prática ANDAR BEM todas as semanas em Sintra e seguir com atenção este balanço feito pela médica Madalena Rapazote.
Como tem sido a vossa experiência ANDAR BEM na USF Monte da Lua?
Madalena Rapazote (MR): Começámos a 9 de agosto, fizemos 31 caminhadas até à data, com 5 canceladas (1 vez durante uma onda de calor e 4 em dias de chuva). Temos mantido a caminhada semanal de 30min. Os grupos variam entre 5-15 pessoas, é bastante dinâmico. Existe um grupo permanente de cerca de 4-6 utentes, que vem a 90% das caminhadas.
Estamos a chegar a uma fase em que se impõe alguma dinamização das caminhadas, gostávamos de ter um grupo permanente maior. Dada a localização isolada da USF Monte da Lua e a limitação dos percursos, o saldo é positivo.
Podemos hoje, passados 8 meses desde o início, referir resultados clínicos positivos?
MR: Alguns resultados são mais fáceis e rápidos de ver: as pessoas com asma/doenças respiratórias foram as que mais facilmente nos reportaram melhorias, maior tolerância ao esforço e menos queixas respiratórias desde que começaram a vir mais regularmente – da nossa parte conseguimos notar a evolução no ritmo da passada (passam do grupo mais lento para o intermédio, ou do intermédio para o mais rápido), chegam ao fim com menos queixas do que nas primeiras vezes.
Há melhorias no humor de alguns doentes mais isolados ou com sintomas depressivos – em geral, o motivo mais apontado nos questionários para manterem a adesão ao Andar Bem é o convívio.
Nos “meus” doentes parece haver uma diminuição das vindas a consulta por motivos desnecessários, que posso eventualmente associar ao convívio das caminhadas (nos doentes mais isolados, ou com patologia mental não controlada, o Centro de Saúde, médico, enfermeiro, e todo o ambiente é um motivo para contacto e comunicação que não obtêm de outras referências, e alguns utentes consomem consultas para suprir esta necessidade).
Em termos de controlo de peso, tensão arterial e diabetes ainda não fizemos esse levantamento; talvez seja ainda precoce ter alguma conclusão porque só vimos alguns doentes 1 ou 2 vezes em consulta programada desde que iniciaram as caminhadas.
É um percurso com que características e dimensão? O percurso é sempre o mesmo? Há incitamentos a ajustes nesse percurso?
MR: O percurso de inverno é o original, cerca de 2,5km. No verão fazemos desvios por zonas de campo e arriscamos em ruas novas na parte final do percurso. Inicialmente as pessoas pediam mais variabilidade nos percursos, e acabámos por fazê-lo no verão, há sempre alguém que conhece um ou outro caminho, experimentamos um pouco, mas infelizmente a nossa zona tem várias limitações a nível de segurança e acabamos por restringir-nos ao percurso original.
É crescente o número de participantes? O que fica de reações?
MR: Houve um aumento inicial no inverno, talvez pela divulgação do projeto, pelo passa-palavra, pelo horário (16:30, versus 18:00 no verão). Há um grupo consistente que tem vindo a crescer devagar, e alguns que vêm só de passagem. Houve quem deixasse de vir no inverno (mais velhotes e mais jovens, pelo tempo e horários), é dinâmico. Nestes dias temos ficado com 5-8 pessoas. Dos que nos dão feedback nesse aspeto, gostavam que o grupo fosse maior mas não é fácil convencer pessoas sedentárias a começar atividade física, os utentes que vêm mais vezes reportam o mesmo com os amigos/vizinhos, …
Como é a adesão do conjunto da USF? Sentem que a experiência é positiva? Que benefícios realçam?
MR: Estamos neste momento a fazer um ponto de situação. É muito desafiante garantir que toda a equipa se empenhe na mesma medida, mas temos garantido todas as caminhadas. Os elementos da equipa que aceitam as manobras que temos de fazer para manter o ANDAR BEM de pé (deixar de marcar 2 ou 3 consultas para ir à caminhada, ficar mais tempo extra-horário, combinar com um colega para ficar a cobrir aquele período de ausência…) acabam por ver esses 30min como uma oportunidade para desligar. Não é fácil porque temos sempre sempre trabalho para fazer, mas obriga-nos a parar um pouco e a voltar com mais foco.
A presença do médico ou de outro profissional da Saúde é determinante para a mobilização das pessoas?
MR: Quem vem, vem independentemente dos líderes, mas saber que vem o seu médico ou enfermeiro de família é uma motivação. Muitos vêm na expectativa de ver o seu médico naquele contexto diferente. Não é uma condição para as pessoas virem, talvez seja mais para aderirem numa fase inicial. Depois, ficam pelo convívio. Embora não o tenham dito, julgo que as pessoas se sentem mais seguras ao serem acompanhados por profissionais de saúde.
Está encontrado um modo eficaz de mobilização das pessoas para o ANDAR BEM? É mais através do passa-palavra, por cartazes ou através de sugestão nas consultas? É sugerida alguma alternativa de divulgação?
MR: Inicialmente a maioria das pessoas soube pela divulgação na consulta e pelos cartazes espalhados pela USF. A partir de uma certa altura passou a ser mais comum o passa-palavra: vizinhos ou amigos que não pertencem à USF, e pessoas que já tinham visto os cartazes, mas que só se decidem a vir caminhar porque um amigo que já caminha o desafiou.
Neste momento temos cartazes nos pontos de passagem mais comuns (Junta de Freguesia, cafés), divulgámos no Jornal de Sintra e na Rádio de Sintra. Sugeriram-nos alargarmos a divulgação a mais locais, e também o Facebook: uma das senhoras partilha algumas fotografias nos grupos locais.
Idealmente gostávamos de ter mais tempo e um núcleo maior para dedicar ao ANDAR BEM e delinear uma campanha mais intensa e abrangente.
Que propostas deixam a partir da vossa experiência ANDAR BEM? Parece-vos que outras USF sentirão facilidade em dar início a programas ANDAR BEM a partir deste formato de formação e apoio da ZEBRA?
MR: O mais desafiante parece-me ser a manutenção do projeto semana a semana, e não tanto o início/divulgação.
São facilitadores da implementação do ANDAR BEM:
- ter recursos humanos suficientes,
- uma equipa envolvida e motivada para fazer disto um projeto de grupo,
- ter acesso fácil a percursos variados, campo aberto ou ruas/passeios mais tranquilos (a nossa maior dificuldade no Monte da Lua),
- e, idealmente, ter à partida o apoio da ZEBRA na pesquisa de alguns percursos alternativos.